Matéria da Agência Brasil cita documento enviado
pela Capes a programas de pós-graduação afirmando a continuidade de todo o
calendário ‘como se não houvesse greve’, enquanto Capes e CNPq não se pronunciam
oficialmente mesmo com seus
servidores paralisados; a greve de
professores de pós-graduação e dos pós-graduandos é parte da greve nas
universidades públicas e precisa ser respeitada
No dia 2 de agosto, a Agência Brasil – portal de
notícias da Empresa Brasil de Comunicação, órgão de comunicação estatal –
publicou uma reportagem tratando da greve nas universidades e sua relação com
as atividades de pós-graduação. Na reportagem, o professor André Lemos, da
Escola de Comunicação da Universidade Federal da Bahia e representante da área de
Comunicação no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
(CNPq) (agência de fomento ligada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e
Inovação), afirma que a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior (Capes) enviou ao seu programa de pós-graduação na UFBA um documento
informando que não haverá qualquer alteração no calendário diante da greve.
Segundo a declaração do professor publicada na
reportagem, o documento enviado pela Capes indica, assim, que “prazo de bolsas,
editais, toda a burocracia das agências está mantida, como se não estivéssemos
em greve”. A reportagem diz ainda que, segundo o professor, esse mesmo
documento recebido pelo seu programa “deve ter circulado em outros programas de
pós-graduação do país” e que, procurados pela reportagem, Capes e CNPq não se
manifestaram sobre o tema.
Nós, que estamos construindo a greve das
universidades federais também no âmbito das pós-graduações, por vários motivos
recebemos com espanto essa notícia. Em primeiro lugar, pelo conteúdo do
documento enviado pela Capes ao programa da UFBA citado pela reportagem: é
inadmissível que o órgão ignore uma greve nacional com as proporções da atual
mobilização e seus reflexos na pós-graduação. Diversos programas de
pós-graduação em todo o país estão paralisados, e há greve estudantil de
pós-graduandos em diferentes universidades do país. Além
disso, agora, os próprios servidores das agências de fomento estão em greve
reivindicando melhores condições de trabalho – mobilização à qual somos
integralmente solidários –, o que certamente afeta o seu funcionamento interno.
Mais do que isso: é impensável que a greve nas
universidades, de maneira geral, não afete a pós e as atividades de pesquisa.
Estudantes de graduação (segmento amplamente paralisado em todo o país) também
pesquisam e nossas atividades são desenvolvidas, muitas vezes, conjuntamente. E
o que falar dos professores e funcionários técnico-administrativos em greve?
Laboratórios, bibliotecas, secretarias e outros espaços, também acadêmicos,
estão paralisados, influenciando diretamente na dinâmica dos cursos de pós.
Em segundo lugar, nos espanta o fato de uma
informação dessa relevância e seriedade estar circulando sem um posicionamento
público e oficial da Capes. Trata-se de um tema de amplo interesse para a
comunidade acadêmica e para a sociedade, e não podemos aceitar que um documento
como esse seja enviado a um ou mais programas, divulgado por uma reportagem de
um órgão estatal e, ao mesmo tempo, o órgão responsável pelo envio do documento
se negue a um pronunciamento público sobre sua posição e o conteúdo do
documento.
O fato de Capes e CNPq silenciarem, à comunidade
acadêmica e à sociedade, sobre um tema tão importante se torna ainda mais grave
diante do fato de que professores e estudantes já se dirigiram formalmente – e
mais de uma vez – aos referidos órgãos reivindicando a revisão do calendário
acadêmico, não tendo obtido qualquer resposta até o momento. O Comando Estadual
de Greve dos Pós-Graduandos do Rio de Janeiro protocolou, no dia 19 de julho,
em Brasília, documentos reivindicando a readequação do calendário de aulas, o
prazo de entrega das dissertações e teses, as datas limites para realização de
outras atividades como relatórios e prestações de contas, a duração do
pagamento das bolsas e demais prazos definidos pelas agências de fomento às
pesquisas proporcionalmente ao período de greve. Além disso, dois documentos
reivindicando que o calendário das atividades das pós-graduações se readequem à
situação presente foram protocolados junto à CAPES, sendo uma carta oriunda do
Comando Nacional de Greve dos docentes (CNG do ANDES-SN) e um ofício advindo da
Associação Nacional dos Pós-Graduandos. No dia 7 de
agosto, uma manifestação organizada pelo CNG do Andes-SN em frente à Capes
conseguiu um primeiro avanço: a agência de fomento recebeu uma comissão de
professores e se comprometeu a encaminhar à presidência do órgão a
reivindicação sobre a alteração do calendário. No entanto, seguimos sem uma resposta
sobre o assunto.
A readequação do calendário é, muito mais do que
uma questão burocrática, o eixo central da garantia do direito de greve aos
pós-graduandos. A postura da Capes, assim, ataca o nosso direito de greve ao
ignorar uma mobilização dessa amplitude e seus impactos em todas as esferas da
universidade brasileira: pressiona e assedia grevistas com prazos que,
obviamente, não poderão ser mantidos no cenário de greve. Reivindicamos,
assim, mais uma vez, o respeito ao nosso direito de greve e a readequação do
calendário previsto pelas agências de fomento diante da paralisação das
atividades de ensino, pesquisa e extensão nas universidades do país.
A greve representa um momento de irrupção do tempo
em que as categorias estão dispostas a discutir propostas que visam à suspensão
imediata do sucateamento estrutural e pedagógico, aprofundado pelos nossos
sucessivos governos neoliberais. A pesquisa acadêmico-científica no Brasil
agoniza. Não pelo seu conteúdo, mas sim pela forma, pois a organização dos
cursos de pós-graduação limita este conteúdo a um tempo e a um espaço
pré-estabelecidos. A expansão dos cursos de pós-graduação que o governo PT vem
proferindo nos últimos sete anos deixa a desejar para quem defende uma expansão
que favoreça a criação livre, densa e sem tempo pré-determinado para seu
término. A agonia da pós-graduação concentra-se no curto tempo cada vez mais
“socialmente” necessário para se realizar uma pesquisa.
A postura de Capes e CNPq desconsidera um movimento
inédito no Brasil: os cursos de pós-graduação decretaram um basta no tempo
limitado de pesquisa e reivindicam a discussão sobre o significado social de um
pós-graduando no Brasil. A nossa reivindicação é por melhores condições de
estudo, mais recursos para os programas de pós-graduação, maior tempo para a
pesquisa, mais verba para a assistência estudantil, como por exemplo,
restaurantes universitários, criação de creches e bibliotecas. As nossas
reivindicações que são uma parte das pautas da nossa categoria – estudantes da
universidade – tem nos movido para a ação de discutir, organizar, escrever,
refletir, analisar dentro do contratempo burguês ou, em outras palavras,
analisar dentro do movimento da greve. Tal movimento de greve vem nos definindo
como partícipes do principio filosófico-político da universidade, nos
reinserindo dentro deste espaço.
Não seria possível, nesse sentido, com a adequação
de calendário letivo que fizemos por conta da nossa greve, manter os prazos
estipulados – a contragosto estudantil – pelos nossos órgãos de fomento: CAPES
e CNPQ. A decisão desses órgãos de continuar as atividades letivas impede o
movimento da pós-graduação em greve. Os órgãos de fomento devem respeitar as
entidades compostas por estudantes da pós-graduação que pararam suas atividades
letivas formais, deixar a cargo que cada universidade apresente a proposta de
calendário letivo formal prorrogar os prazos de recebimento de bolsas de
auxílio à pesquisa, das elaborações preliminares das qualificações de projetos de
mestrado e doutorado, além das elaborações “finais” das defesas de mestrado e
também de doutorado.
Garantimos, com isso, a subsunção dos
indivíduos e das instituições ao princípio filosófico-politico da universidade,
asseguramos a articulação entre as três esferas que balizam o sentido social e
político deste espaço e damos um salto qualitativo da abstração criativa,
necessária para transformar os nossos espaços de luta, as nossas práticas,
Comando
Estadual de Greve dos Pós-graduandos do Rio de Janeiro.
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